Quem anda no trilho é trem de ferro, sou água que corre entre pedras: liberdade caça jeito.
Manoel de Barros

quarta-feira, 29 de julho de 2009

25 de Julho: temos pouco o que comemorar e muito a reivindicar.


Ser mulher e negra no Brasil ainda é um fator
que gera exlusão e desigualdades,
o que vocês pensam
sobre as lutas e resistências das
guerreiras
mulheres negras?

Vamos refletir?


por Alzira Rufino

Durante o 1º Encontro de Mulheres Afro-latino-americanas e Afro-caribenhas, realizado em Santo Domingo (República Dominicana) em 25 de julho de 1992, definiu-se que este dia seria o marco internacional da luta e resistência da mulher negra.
No Brasil, o projeto (PLS 23/09) da senadora Serys Slhessarenko (PT-MT) foi aprovado no dia 17 de julho, em decisão terminativa pela Comissão de Educação.O projeto Determina que a situação da mulher negra brasileira seja debatida a cada dia 25 de julho; logo a data passaria a ser celebrado como o Dia Nacional de Tereza de Benguela, líder quilombola do século 18, que resistiu por mais de 20 anos à escravidão à frente do Quilombo do Quariterê (MT) e da Mulher Negra.
Ter acesso e poder ler e reler a participação da mulher negra dos primórdios até os dias atuais são exemplos que nos anima a continuar na trilha. Estamos sempre em pé de guerra ,nós aprendemos a lição de Palmares, outros tempos, outras armas para atuar na defesa dos princípios democráticos garantidos na Constituição da república Federativa do Brasil.
Para nós,mulheres negras o dia serve também como reflexão no pensar estratégias para romper com o mito da mulher universal ,já que a sociedade em geral precisa compreender que as mulheres negras latino-americanas e caribenhas também vivenciam a opressão de gênero, porém, existe diferenciação com respeito à falta de oportunidades e de direitos em todos os âmbitos da sociedade pública e privada.
De acordo com o Índice de Desenvolvimento Infantil (IDI) de 2008, das 27 Unidades da Federação o Brasil tem grandes chances de alcançar o Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM) 4, que trata da redução da mortalidade na infância. Contudo, as crianças pobres têm mais do que o dobro de chance de morrer, em comparação às ricas. A mortalidade infantil entre crianças filhas de mães negras é cerca de 40% maior do que entre as filhas de mães brancas.
O Brasil, de acordo com o índice de desenvolvimento de gênero, IDG (relatório de desenvolvimento humano elaborado pelo PNUD), ocupa a situação de septuagésimo nono (79º) lugar entre 143 países, no que se refere aos indicadores de desigualdade entre sexos. Quando se refere à população negra, o Brasil no recorte gênero, raça/etnia fica em nonagésimo primeiro lugar (91º). No IDH de 2002, em 65º. Nas relações de gênero aspectos da raça/etnia e classe social obtivemos a criação de leis, executarem o que foi assinado é que são eles.
Muito por reivindicar contra a violência ideológica imposta no cotidiano com a nossa imagem que de tão estereotipada induz nossas meninas negras a sentirem vergonhas de serem negras.
Muito a cobrar para a execução do Plano Nacional da Saúde da População Negra no SUS quanto às doenças específicas da mulher negra. Necessitamos de um olhar diferenciado dos profissionais de saúde com respeito ao tratamento da hipertensão, diabetes mellitus, as doenças cardiovasculares; da anemia falciforme para diminuir a mortalidade precoce de doentes falciformes, DST/HIVAIDS, câncer de mama, útero, e de pulmão, a depressão, alcoolismo, estresse, infecções, cirrose hepática a saúde mental só para citar as mais comuns. Não poderia deixar de citar a responsabilidade de se reciclar a saúde pública para outro olhar para atendimento de casos de violência doméstica, sexual e racial, como também o reconhecimento das ações de saúde prestadas pelos terreiros de candomblé.
Estamos incluídas nas maiores taxas de desemprego e recebemos rendimentos com cerca de 60% a menos que as demais mulheres.
Estarmos inclusas como maioria do mercado informal não é opção nossa, vêm da necessidade para sobreviver à fome. Se 1% do percentual de 56% das trabalhadoras domésticas possuem registro em carteira ,na atual crise econômica os dias no emprego e salário diminuíram,no entanto,o serviço fica acumulado e não existe o pagamento das horas extras.
Somos as filha de avó, das tias crecheiras, das irmãs mais velhas.São ainda as filhas e filhos de patroas que passam mais tempo com nossas mães.
O poder é bom e queremos sim atingir os espaços institucionais de poder. Dos 30% da cota de estabelecida em lei, ainda esbarramos no acesso a estrutura e disputa de legenda. As poucas que conseguem ultrapassar as barreiras do machismo/ racismo partidário, ainda são utilizadas para somar votos ao candidato majoritário, mas nós resistimos e insistimos e queremos lá chegar. Afinal, vivemos ou não num país democrático?
Se ainda não temos acesso à informação tecnológica continuaremos na resistência a para que nossas filhas e filhos consigam , a igualdade de direitos.
Com certeza estamos otimistas em ver a rica história de nossa gente contada com dignidade na escola. A lei 10.639/03 gradativamente sairá do papel,resistimos para que a nossa descendência usufrua da herança. Abolição assinada a lápis o tempo apaga, no entanto, nós mulheres negras latino-americanas e caribenhas estamos reescrevendo-o com tinta forte.
Revisar o Plano de Durban juntamente com os governos nas Conferências Regionais que culminaram na II Conapir ,como também as outras Conferencias realizadas na América Latina e Caribe revelaram que nós estamos caminhando para o além do poder sonhar.
Nossa consciência nos leva a trabalhar para que especificidades da mulher negra sejam assumidas pelo Estado como compromisso de execução . Antes,durante e Pós Durban aprendemos a resistir para que se executem de fato as políticas públicas que nos incluam na estrutura social brasileira.
25 de Julho, pouco a comemorar e muito a reivindicar. Neste sentido, a mídia pode ser uma grande aliada para dar visibilidade denunciando as condições da lentidão de implementação das políticas públicas que contemplem as mulheres negras e indígenas.
A data não é só de comemoração mas de denúncia para informar a população brasileira as condições de vida das mulheres negras no Brasil, América Latina e Caribe.


Texto extraido do Livro E a mulher negra como fica?
autora Alzira Rufino, e-mail: ccmnegra@uol.com.br

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